O Dia Mundial da Paz é comemorado em quase todo o mundo em primeiro de janeiro. Nesse dia, as pessoas trocam votos de alegria, de paz e de felicidade para o ano que se inicia. Tradicionalmente as pessoas ficam acordadas até a meia-noite do dia 31 de dezembro, quando se comemora com muita festa a virada do ano. Esse dia foi criado em 1968, pelo Papa Paulo VI, para que fosse celebrado pelos verdadeiros amigos da Paz, independente de credo, raça, posição social ou econômica.
Celebração da paz – 2010
Não somos livres para praticar o mal. Se o fizermos, incorreremos na condenação divina
Jornal do Brasil
Considero salutar apresentar alguns trechos dessa mensagem do papa Bento XVI para semear nos corações de todos o desejo de uma reflexão maior acerca do que se verifica no mundo quanto à limitação ou negação da liberdade, de discriminação, marginalização, perseguição e violências, principalmente no âmbito da fé.
Esta verdadeira ânsia que nos faz reagir até quando algo aparenta limitações a este direito tem efeitos diversos. No sentido autêntico, constrói um mundo livre e é o alicerce da sociedade; quando erroneamente confunde o real significado com abusos, destrói a ordem, necessária ao bem comum. Os limites existem e, quando transpostos, é ameaçado o relacionamento com o Senhor e os semelhantes.
No caso da religião, segundo Bento XVI, “entre os direitos e as liberdades fundamentais radicados na dignidade da pessoa, a liberdade religiosa goza de um estatuto especial. Quando se reconhece a liberdade religiosa, a dignidade da pessoa humana é respeitada na sua raiz e reforça-se a índole e as instituições dos povos. Pelo contrário (...), acabam ameaçadas a justiça e a paz, que se apoiam sobre a reta ordem social construída à luz da Suma Verdade e do Sumo Bem” (nº 5).
O Concílio Vaticano II nos ensina que Deus quis “deixar ao homem o poder de decidir”, para que destarte procurasse espontaneamente seu Criador, a ele adira livremente e chegue à perfeição plena e feliz. E acrescenta que o homem consegue essa dignidade quando, liberado de todo cativeiro, caminha para seu fim pela escolha livre do bem.
A propósito do tema do Dia Mundial da Paz podemos apreciar, num âmbito mais amplo, a acepção da palavra liberdade. Ela pede uma autêntica interpretação. O primeiro passo é clarificar as ideias. Assim, por exemplo, não somos livres, como prerrogativa nossa, para praticarmos o mal. Se o fizermos, incorreremos na condenação divina e da lei do homem. Esta tem por dever punir, coibir através da legislação justa. Caso contrário, semearão ventos e colherão tempestades.
Lemos, em São Paulo, um lúcido esclarecimento: “Tudo lhe é permitido, mas nem tudo edifica. Por isso, tomai cuidado para que essa liberdade não se torne ocasião de queda para os fracos” (1Cor 6,12; 8,9). Somos livres, portanto, se cumprimos os mandamentos de Deus e dos homens. Infringi-los é abusar de um privilégio, deturpando-o e arrostando com as consequências do foro divino e humano. “Uma liberdade hostil ou indiferente a Deus acaba por se negar a si mesma e não garante o pleno respeito do outro. Uma vontade que se crê radicalmente incapaz de procurar a verdade e o bem não tem outras razões objetivas nem outros motivos para agir senão os impostos pelos seus interesses momentâneos e contingentes” (nº 3).
Na celebração do Dia Mundial da Paz, verifiquemos se a liberdade, no seu sentido verdadeiro, está sendo respeitada por nós. Isto é indispensável à paz. Bento XVI convida todos os homens de boa vontade, entre os quais de maneira especial os fiéis, a colocar a liberdade, em todos os âmbitos, a serviço da paz. De sua compreensão correta e da aplicação nos vários setores da vida humana muito depende o bem comum, pois uma casa precisa de fundamentos sólidos.
Dom Eugenio Sales
*Arcebispo emérito do Rio