24/05/2012 - Autor: Fabiana Frayssinet - Fonte: IPS
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Negar a mudança climática, como prega uma corrente científica
mundial, é igual fazer o mesmo com o Holocausto do qual foram vítimas milhões
de judeus, alertam os promotores de um encontro de legisladores, acadêmicos e
ativistas, que acontecerá paralelamente à Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável (Rio+20). O deputado brasileiro Alfredo Sirkis, do
Partido Verde (PV), expressou preocupação pelo que qualifica de uma “forte
ofensiva” nessa linha de negação, que atribui a “uma visão lançada em Londres
pela indústria do carvão e do petróleo” e por setores norte-americanos do
opositor Partido Republicano ou vinculados ao movimento direitista Tea Party.
“A ‘negação climática’ é tão patética quanto a do Holocausto ou
a dos médicos que, no passado, pagos pela indústria do tabaco, declaravam nos
jornais e na televisão que não estava comprovado efetivamente que fumar causa
câncer de pulmão”, disse Sirkis à IPS. Esta nova visão sobre a mudança
climática não tem “nenhum respaldo científico sério”, alertou. Algumas dessas
vozes argumentam que os ciclos de aumento e redução do gelo no mar Ártico
demonstram que o aquecimento global é um mito e que, pelo contrário, haverá um
esfriamento planetário até o final deste século.
Para o deputado, embora essa opinião represente uma “faixa
totalmente marginalizada” da comunidade científica e relativamente pequena da
opinião pública, “tem sua estridência e nunca é demais chamar a atenção para
isso”. Sirkis falou à IPS por ocasião do lançamento, no dia 21, da Rio Clima
(Rio Climate Challenge), reunião que acontecerá entre 14 e 17 de junho, no Rio
de Janeiro, paralela à Rio+20, que será realizada de 20 a 22 do mesmo mês.
Segundo explicou, com essa iniciativa se busca conseguir que um tema importante
como a mudança climática “não passe em branco” na Rio+20, onde não será
abordada de forma direta, mas que vai “pairar sobre ela como um fantasma”.
A Rio+20, que reunirá delegações dos 193 países-membros da
Organização das Nações Unidas (ONU), tem como principais temas a economia verde
e a governança mundial com relação à questão ambiental, com um enfoque não
apenas ecológico mas também social e econômico. “Faltava na Rio+20 um momento
em que se pudesse discutir o principal problema que a humanidade enfrenta, em
médio e longo prazos, que é a questão climática”, destacou Sirkis, um dos
organizadores da Rio Clima, que tem o apoio do governo de Dilma Rousseff.
“Como se pode tratar a economia verde ou as boas práticas de um
governo se não vamos debater sobre o clima, ou abordar o modo como se chega a
uma economia de baixo carbono, a energia limpa… E com financiar isso?”, Sirkis
questionou durante a cerimônia de lançamento do encontro. O deputado chamou a
atenção para os fatores de risco “catastrófico” do aquecimento global, que
motivaram a necessidade da Rio Clima como a reunião paralela, que considerou “a
mais importante” e cujos resultados serão apresentados na conferência das
Nações Unidas.
O deputado recordou o consenso existente sobre o aumento da
temperatura em três a seis graus até o final deste século, e das secas ou
chuvas, entre outros eventos climáticos, que acontecerão cada vez mais fortes e
frequentes, com suas consequências trágicas sobre as populações. Segundo disse,
se não se reverter a atual curva de emissões de gases-estufa, corre-se o risco
de chegarmos ao final deste século com uma elevação da temperatura de 4,5
graus, que derivará em outros efeitos, como liberação do gás metano do Ártico e
do fundo do mar e a perda de capacidade de absorção de carbono dos oceanos e
das selvas tropicais.
“Se o aquecimento do planeta pode se retroalimentar como um
círculo vicioso catastrófico, ainda não sabemos”, observou Sirkis, recordando a
possibilidade de um “inferno na terra” com o colapso da agricultura, a extensão
da fome, as migrações descontroladas, a escassez de recursos como água e terra
fértil, e furacões e inundações. Nesta direção, segundo o deputado, a Rio Clima
busca mostrar um caminho “ambicioso mas possível” para manter a concentração de
gases-estufa na atmosfera abaixo dos 450 ppm (partes por milhão) e o aumento
médio do aquecimento do planeta, este século, abaixo dos dois graus.
“A ideia é construir um cenário factível e um acordo simulado de
clima” negociado por líderes e formuladores de políticas públicas dos países
emissores de gases-estufa causadores do aquecimento global e de outras nações
vulneráveis a isso, disseram os organizadores. “Temos uma janela de 20 a 30
anos para prevenir essa catástrofe anunciada e viabilizar uma economia de baixo
carbono”, entre outras com energias limpas, advertiu Sirkis.
Os promotores da Rio Clima (as autoridades do Rio de Janeiro e
de Pernambuco, o Congresso Nacional, setores empresariais e o não governamental
centro de estudos do mar Onda Azul, entre outros) querem que a iniciativa seja
como um grupo de estudos permanente com sede no Rio de Janeiro, destinado a
interagir com fóruns existentes e futuros sobre mudança climática. Entre os
convidados para o encontro está Maurice Strong, ex-secretário-geral das
conferências das Nações Unidas sobre meio ambiente.
O mais importante dos dois encontros ambientais é que
“aconteçam”, enfatizou à IPS o ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, que deverá
encerrar a Rio Clima com um show. “O fato de estar juntos, preocupados com o
futuro, é o que garante o êxito. As outras coisas, o que pode propriamente
surgir como resultado, documentos, compromissos para o futuro, são produtos
desejáveis, mas o sucesso em si mesmo é a reunião propriamente dita, que a
façamos”, acrescentou.
Fonte: Instituto Carbono Brasil