11/09/2012
Resíduos tóxicos resultantes da
operação de extração de petróleo de plataformas marítimas seriam despejados sem
nenhum tipo de tratamento, diz Polícia Federal.
Plataforma P-18, da Petrobras: as investigações mostraram que a Petrobras é "leviana" no tratamento de resíduos da extração petroleira
Rio de Janeiro - A Polícia Federal (PF) acusa a
Petrobras de despejar no oceano toneladas de resíduos tóxicos resultantes da
operação de extração de petróleo de plataformas marítimas sem nenhum tipo de
tratamento. Inquérito da Divisão de Crimes Ambientais da PF no Rio concluiu que
a empresa não respeita a legislação sobre o tratamento e o descarte da água
tóxica - chamada de "água de produção" ou "água negra" -,
que se mistura ao óleo prospectado nas unidades marítimas de produção.
Para o delegado Fábio Scliar,
responsável pelo inquérito, as investigações mostraram que a Petrobras é
"leviana" no tratamento de resíduos da extração petroleira. A
fiscalização a cargo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama) é ineficaz, segundo a PF. Na avaliação do delegado,
os danos ambientais provocados pelo descarte irregular da água de produção nas
plataformas de petróleo "é 300 vezes maior" do que os impactos
resultantes do vazamento de óleo do Campo de Frade, da empresa americana
Chevron, na Bacia de Campos, no ano passado.
"O impacto é 300 vezes maior
do que o vazamento da Chevron no ano passado. O negócio vem desde que há
exploração de petróleo no Brasil", afirmou Scliar. "Essa água negra é
descartada há décadas no oceano sem o tratamento adequado. E não há
fiscalização qualquer. Isso é um segredo nacional de décadas", disse o
chefe da Divisão de Crimes Ambientais.
Mistura
A água negra é uma mistura de água do mar com óleo, graxa e inúmeras
substâncias tóxicas, como os metais pesados bário, berílio, cádmio, cobre,
ferro, e até radioativas, como estrôncio-90 e bismuto-214, entre outros. O caso
foi revelado em reportagem publicada nesta quinta-feira (6) no site da Revista
Época. De acordo com as investigações da PF, a Petrobras informou que 99% da
água de produção extraída junto com o petróleo são tratadas nas próprias
plataformas marítimas. O inquérito ressalta, no entanto, que nem todas essas
unidades contam com estações de tratamento. Segundo a PF, apenas 29 das 110
plataformas têm capacidade de limpar o líquido tóxico antes de seu retorno ao
mar.
O 1% restante da água negra segue
para refinarias da Petrobras, onde também deveria receber tratamento. Segundo a
PF, isso não acontece. A unidades de tratamento estão desativadas. O líquido
tóxico é embarcado em navios da empresa, "onde, sem tratamento algum,
serão despejadas em alto mar", afirma o inquérito enviado pelo delegado
Scliar à Procuradoria da República em São João de Meriti há dois meses.
Investigação
As investigações começaram há 10 meses. A PF realizou operações para apurar
suspeita de descarte de poluentes da Refinaria de Duque de Caxias (Reduc), a
quarta maior da Petrobras, diretamente nas águas do Rio Iguaçu e na vegetação
da região. Em todas foram confirmadas irregularidades. A Petrobras foi multada,
segundo a PF, e se comprometeu a erguer até 2017 uma nova unidade de tratamento
de resíduos.
No andamento da investigação, no entanto, servidores públicos responsáveis pela
fiscalização ineficiente da empresa comentaram com os agentes federais que pior
do que os descartes de poluentes pela Reduc era o derrame da água de produção nas
plataformas e refinarias. "Uma inconfidência de um servidor público da
área de meio ambiente sobre o problema da água de formação nos chamou a
atenção. Como aquilo não era o meu alvo no momento, eu captei e fiquei quieto.
Depois que eu resolvi a questão da Reduc, resolvi investigar essa
história", disse o delegado Scliar. "Acabei desvendando essa
história, que, para mim, é um absurdo. É uma política absurda. Uma enganação ao
povo brasileiro", afirmou o delegado federal.
O inquérito já está no Ministério
Público Federal, que deve denunciar por crime de poluição pelo menos dois
gerentes da empresa pelas irregularidades constatadas na Reduc. Outro inquérito
civil está em andamento para responsabilizar, e multar, a Petrobrás. O
procurador Renato Machado informou que vai enviar cópias de toda a documentação
do caso para a Procuradoria-Geral da República (PGR) em Brasília, onde será
definida a abertura de novos inquéritos para apurar o despejo de água de
produção nas plataformas marítimas espalhadas pelo País.
Outro lado
Em nota enviada pela assessoria
de imprensa, a Petrobras informou que atende a todos os requisitos da
legislação ambiental brasileira e internacional. "A água produzida junto
com o petróleo nas plataformas é tratada e descartada de acordo com a
legislação brasileira, que é tão rigorosa quanto nos EUA e na Europa. Nas
plataformas onde não há sistema de tratamento, a água é enviada para outras
plataformas ou outras instalações para destinação adequada", informa o
texto.
Os descartes de água, segundo a nota, atendem a resoluções do Conama e a
Convenção da Organização Marítima Internacional (IMO). "Também na
Refinaria Duque de Caxias, todos os efluentes são tratados. O descarte respeita
a legislação brasileira. A reportagem (da Época) reproduz as citações dos
profissionais da Petrobras de forma parcial e descontextualizada", diz o
texto da empresa.
Também por nota, a assessoria do Ibama informou que "exige de todas as
empresas petrolíferas o estrito cumprimento da legislação ambiental, incluindo
os padrões de descarte de água de produção estabelecidos pela Resolução Conama
nº 393/07". O instituto diz que realizou 90 autuações referentes ao
descarte de água de produção fora das especificações do Conama, aplicando essas
sanções a diversas empresas petrolíferas, e que conta com 80 analistas
ambientais especializados para função.
Fonte: Exame