Dr. Dirceu Rodrigues Alves Jr.
Entender o funcionamento do veículo, as
forças físicas atuantes, a educação preventiva, defensiva, as situações de
risco, as condições meteorológicas e adversidades, a atividade diurna e
noturna, a via urbana e estrada são algumas das necessidades básicas para a
concessão da Carteira Nacional de Habilitação. Não se pode esquecer que, como
toda atividade, é necessário a educação continuada, correção dos vícios
adquiridos, atualização com relação a legislação, a sinalização e outros.
Situações de risco, precisam ser vivenciadas,
colocadas na prática tanto no treinamento inicial como na
educação
continuada.
Veja que até a legislação, desconhecendo as leis da
física, permite situações extremamente perigosas e parece não preocupar-se com
condições de trabalho, de transporte de usuários e até com a concessão da
Carteira Nacional de Habilitação.
Exemplo típico é a posição de trabalho de cobradores
de ônibus, que ficam posicionados no sentido transverso à direção do veículo o
que é totalmente contra indicado do ponto de vista ergonômico. Não só a do
cobrador, mas aqueles veículos que possuem bancos ou poltronas laterais para
passageiros.
O motivo da contra indicação
baseia-se na falta de controle do centro de gravidade de quem viaja sentado
nesses bancos, sofrendo as ações da aceleração e desaceleração que o obrigam a
fazer durante todo o percurso movimentos pendulares da coluna lombar e
movimentos ativos de membros superiores e inferiores buscando o equilíbrio
necessário para manter-se em posição. Também, pelo fato de ter um campo visual
restrito, com pouca visão de profundidade, com imagens passando rapidamente na
janela contra lateral, o que, somado às condições já descritas, induzem mais
rapidamente o trabalhador ou usuário a um estado hipnótico, com torpor e sonolência.
As imagens passando em seu campo visual é como se tivesse um pendulo a sua
frente levando-o a um estado hipnótico.
O banco colocado no sentido
transverso à direção do veículo trás transtornos à saúde.
Somando-se os movimentos repetidos de procura ao
centro de equilíbrio e a vibração de corpo inteiro, temos como entender que tudo
isso leva ao esgotamento muscular e dependendo do tempo de exposição, a fadiga
será o sintoma predominante.
Não só as alterações ergonômicas do
deslocamento nesta posição preocupam, mas também a total falta de proteção em
termos de segurança. Uma frenagem brusca ou mesmo uma colisão, produzirá
traumatismo de arcos costais, de membros superiores e inferiores, além de
outras consequências imprevisíveis.
Nessas condições são comuns
os seguintes sintomas:
- náuseas
- vômitos
- tonteiras
- vertigem
- visão borrada
- fadiga visual
- dor lombar
- dor muscular
DECRETOS, LEIS, RESOLUÇÕES TAMBÉM
SÃO RESPONSÁVEIS POR ACIDENTES DE
TRÂNSITO.
O transporte de pessoas de pé, tanto na
via urbana como na estrada, sem fiscalização, é outra permissão inadequada.
A aceleração ou desaceleração brusca faz
com que o indivíduo sentado ou de pé no veículo tenha seus órgãos deslocados
para trás ou para frente, dependendo de uma ou de outra condição, com um peso
proporcional a velocidade do veículo. Caso o veículo esteja a 100 km / h, na
desaceleração brusca por frenagem ou colisão, o indivíduo no interior desse
veículo será deslocado do seu assento ou da sua posição de pé a 100 km / h,
isto é, na velocidade em que estava o veículo antes da frenagem ou colisão.
Assim por exemplo, se estamos
a 100 km / h e o peso do motorista, cobrador ou usuário seja de 70 kg, numa
aceleração ou desaceleração brusca, esse peso será multiplicado e o peso final
estará muitas vezes acima do peso inicial. Imagine o impacto dessa massa com
uma superfície sólida. Não há dúvida que teremos um politraumatizado com lesões
gravíssimas. É por isso que o perito, sabendo a velocidade do veículo no
momento do impacto, pode estimar os danos provocados nas vítimas.
Estamos tão somente
destacando pequenas coisas desconhecidas para a grande massa de motoristas e
que estão atreladas a gravidade dos acidentes.
Esse não é um ensinamento comum nas
auto-escolas, mas é necessário que todos tenham conhecimento que uma pessoa
dentro de um veículo fica susceptível ao que chamamos de “Cinemática do
Trauma”. Se esses conhecimentos fossem passados a quem busca a habilitação para
direção veicular ou mesmo numa educação continuada, acredito que a ciência
física daria subsídios importantes para maior segurança na direção veicular.
Ninguém imagina porque as
colisões causam tantas lesões, mas com o conhecimento da cinemática do trauma
tudo é elucidado.
Observe no quadro a baixo quanto passa a
pesar uma víscera numa desaceleração por frenagem ou colisão.
Não é necessário delongar para
entender que o aumento considerável do peso dos órgãos internos pode provocar
rupturas com hemorragias internas, arrancamentos, deslocamentos, etc., com
exagerado aumento da gravidade do quadro.
Precisamos
mais cautela, conhecer profundamente todas as situações de risco da máquina
sobre rodas.
Se dentro de uma fábrica, com
máquinas fixas, a legislação e as normas regulamentadoras do trabalho
determinam que se zele pela segurança do operador, seja fornecido equipamento
de segurança, haja treinamento frequente e ainda se agregue à máquina sensores
para desligá-la em situação de risco. Porque não darmos a mesma atenção ao operador
de máquina sobre rodas? Esta é a mais perigosa, transporta e circula entre
pessoas.
Espera-se sempre maior treinamento
para as situações de risco. Ter treinamento em atividade diurna, noturna, com
chuva, neblina, e outras condições anormais, na via urbana e na estrada. Ter
pleno conhecimento da utilização do freio comum e ABS e estar conectado
permanentemente à direção preventiva e defensiva.
É necessário ampliarmos
conhecimentos sobre os riscos inerentes à atividade sobre rodas. O recebimento
hoje da Carteira Nacional de Habilitação não significa que estamos habilitados
para a atividade veicular. Este documento nos libera para o treinamento e
aprendizagem individual, independente de acompanhamento e orientação. É,
infelizmente, nessas circunstâncias que vamos enfrentar as situações de risco,
com total desconhecimento. Daí surge à maior parcela das nossas estatísticas
absurdas de acidentes de trânsito.
De posse
dessa CNH sabemos apenas fazer o veículo andar e continuamos totalmente
despreparados para as situações de risco que surgirão no dia a dia.
Conclusão:
Precisamos de
mudança radical na formação de nossos condutores. Educar, conscientizar para os
riscos, identificar o veículo não para atividade radical, mas sim para a mobilidade
segura, respeitando as regras de trânsito, os parceiros e a cidadania.
Conscientizando-se de que a máquina sobre rodas é extremamente perigosa e além
de tudo compromete a saúde e o meio ambiente.
A Carteira
Nacional de Habilitação é uma concessão do estado, como tal, pode ser caçada
diante de comportamento inadequado do condutor. Precisamos treinamento e
educação continuada para conhecer mais, muito mais do que é ensinado nos Cursos
de Formação de Condutores.
Dr. Dirceu Rodrigues Alves Júnior.
Diretor de Comunicação e do Departamento de
Medicina de Tráfego
Ocupacional
da ABRAMET.
Associação Brasileira de Medicina de Tráfego